A primeira vez que li o livro “Meu pé de laranja lima” era menina. A segunda, na adolescência. Agora, passados alguns anos, leio “a história de um meninozinho que descobriu a dor” pela terceira vez. Leituras diferentes, portanto. Mas, independentemente das fases que separam essas leituras, os sentimentos despertados são os mesmos: um misto de alegria ( pela magia das brincadeiras e invenções do Zezé) e desencanto ( pela falta de sensibilidade dos adultos em relação universo mágico das crianças).
Aos nove ou dez anos de idade eu tinha caderno de recordação, com capa amarela,onde anotava títulos e nomes de autores de livros que mais gostava. Era nele que escrevia, também, nomes dos personagens, copiando ao lado de cada um, suas falas mais bonitas. Lembro que depois de ter lido Meu pé de laranja lima, transcrevi várias passagens da comovente história de Zezé. Um dia, porém, não sei como, perdi meu caderno de recordações. Movi mundos para encontrá-lo, mas nunca soube do seu paradeiro. É obvio que não lembro de todos os títulos de livros da minha lista de preferidos. Mas, tenho ainda guardado um exemplar do “Meu pé de laranja lima”, capa azul, 11ª edição, onde aparecem minhas anotações. Muitas delas possivelmente selecionadas para serem registradas no caderno de capa amarela. E, creio eu, com a mesma emoção que agora sublinho outra passagem, falando de um sol que ilumina tudo de felicidade. Igual emoção que me levou a buscar outros livros do mesmo autor: Rosinha, minha canoa, Coração de Vidro, Palácio Japonês, Doidão, Arara Vermelha, Arraia de fogo e Rua descalça.
Por isso, se pretendemos analisar a obra Meu pé de laranja lima é necessário estar desarmado, com olhos de quem lê com o coração aberto, pronto para conhecer e viver uma história que mexe com os dramas humanos. Trata-se de um texto escrito numa linguagem simples, com narrativa linear. Mas, que nos mostra a habilidade de um autor/contador de histórias. Habilidade esta que dá ao texto a sustentação necessária para capturar a atenção do leitor para um encontro com sua criança interior.Talvez este seja um dos maiores méritos de José Mauro de Vasconcelos: ter vivido tantas aventuras, convivido com pessoas de diferentes origens e lugares e conseguir apresentar os personagens e cenários em narrativas ricas em detalhes, prontas para serem partilhadas pelos mais diferentes públicos. José Mauro escreveu histórias com a intensidade de quem experimentou a vida.
Histórias como a do personagem Zezé, cinco anos de idade ( e que dizia ter seis) , um menino pobre, inteligente e sensível que sofria com a violência e a insensibilidade da família. A realidade de Zezé- que se aproxima da realidade de muitas crianças - comove e faz pensar no quanto o mundo adulto pode interferir ( positiva ou negativamente) no desenvolvimento de uma criança.Zezé busca o afeto que não encontra na família nas pequenas coisas, em especial ao Pé de laranja lima, o Minguinho. E é através dessa amizade e do seu encontro com o “Portuga” que consegue superar suas tristezas e recuperar a esperança de encontrar a ternura que em muitos momentos pensou ter perdido para sempre.
A leitura de “Meu pé de laranja lima” é uma oportunidade para se lembrar o quanto as crianças ensinam quando nós, adultos, sabemos ouvi-las com atenção e o respeito que merecem.
1º Encontro Reinações Caxias, 22 de julho de 2009.
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