Onde está o brinco? Tocou
a orelha direita demoradamente e ergueu os olhos para cima, lembrando seu
percurso, tentando recuperar cada passo dado. Vasculhou todos os lugares.
Inútil-pensou. E querendo consolar-se, lembrou das outras pérolas que
permaneciam adormecidas em suas
conchas.Então, parecendo conformada conseguiu escutar o barulho do mar, perto
da infância, numa distância curiosa: o horizonte que seus olhos de menina
alcançavam rapidamente.
Fixou seu
olhar na própria imagem refletida no espelho.Faltava-lhe um brinco.Caminhou até
a janela, inclinando o corpo para frente na tentativa de enxergar melhor o
romper das ondas no quebra mar.”Chegou a hora de buscar os corais.” Tirou o
brinco da orelha esquerda,examinando-o com o carinho de quem contempla uma
pequena parte da vida - uma lembrança que se guarda escondida em algum cantinho
da alma. Olhou-o mais uma vez e
sentiu-se em meio ao círculo do princípio e do fim.Olhou demoradamente para o
brinco que tirara da outra orelha e depois
guardou-o em uma pequena caixa.Saiu, batendo a porta.Desceu a escada.
Caminhou até o hall de entrada.
Porém, uma
voz interior tentava demove-la:”Volta,
Cristina,volta!” Seus pés não recuaram e
estranhos pensamentos lutavam entre si.Havia uma descabida disputa entre os
sonhos e a realidade. Ao seu redor, como poeira colorida o arco-íris semeava um
canteiro de lírios. No céu as nuvens pareciam mais brancas e, ao longe,
a luz do mar refletia um movimento
calado.Enxergava o porto e os barcos.Então, pegou o passaporte e uma mala cheia
de sonhos.Tirou a pequena caixa de dentro da bolsa e contemplou a pérola.Depois
voltou a guarda-la no mesmo lugar. Procurou espaço para manter-se em
equilíbrio, elevando-se à quintessência.E, seguindo o rastro de um pequeno crustáceo,
atravessou outra orla. Acenou para alguém, gritando para que a esperasse-talvez
soubesse que o leme tinha a coragem de um navegar seguro.
Perdera seu brinco de pérolas, mas uma louca alegria
fazia ressurgir nela a esperança. Cada parte do seu corpo queria mais do que o calor do sol podia dar. E,
daquele dia em diante viu-se pulando as
ondas, uma a uma, prenunciando encontros
entre o céu e o firmamento.
Por um
momento até pensou em voltar atrás e deitar outra vez na cama onde descobrira o
amor. Queria continuar acreditando que o sempre seria o começo de tudo. Naquele
instante presenciara a criação quase
absoluta de um universo que guardava a reserva do tempo e do mundo. Tudo para si mesma. Não podia esperar. Andar,andar, andar. Seguir os
rumos do coração, repousando sua alma num leito de carne e osso.E repetir, sem
cansar: há uma longa vida pela frente e um imenso continente a ser habitado.
Heloisa Carla
Coin Bacichette
Caxias, março
de 2005
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